sábado, 18 de fevereiro de 2017

Café do Zequinha (Belmonte)


Em Belmonte, todos os caminhos vão dar ao Café Montebelo. Repita lá! Pois, por este nome ninguém o conhece, mas se dissermos Café do Zequinha a conversa muda de figura. Há mais de meio século que o estabelecimento comercial é o mais emblemático da vila, localizado bem no centro, na Rua Pedro Álvares Cabral e em frene à estátua do navegador.
Até 1949, foi uma loja de fazendas, mas um incêndio destruiu tudo e dois anos depois o espaço era convertido em café. Um dos primeiros da vila (havia outro junto à Câmara, que entretanto fechou).
A história do café confunde-se com a do proprietário, o sr. Zequinha. Quase ninguém sabe o seuverdadeiro nome. Ora, aqui fica: José Santos Costa. Problemas de visão levaram-no a passar muitos anos em Lisboa, em tratamento, e só em 1965, com a situação parcialmente resolvida, regressou a Belmonte. Os pais compraram o café para ele gerir e nunca mais de lá saiu, até hoje. Com 88 anos, continua por ali, diariamente, com a companheira de aventura, a esposa Alice Costa (22 anos mais nova). “Estamos aqui há mais de 50 anos. Esta foi e é a nossa vida, uma vida de sacrifício, de muito trabalho.”
Empreendedores como poucos, não se contentaram com o café. Ele ainda foi presidente da Junta de Freguesia de Belmonte. Ao mesmo tempo criaram fábrica de batatas fritas, onde chegaram a trabalhar nove funcionárias. “Um ficava no café e o outro ia distribuir as batatas pela região. Foi assim durante 20 anos”, conta a dona Alice, revelando algumas agruras: “Durante estes anos todos, nunca fomos de férias em família. Eu ia com os meus filhos (um rapaz e uma rapariga com sete anos de diferença) até à praia, mas o meu marido ficava. Noutras ocasiões era ele que precisava de ir a Lisboa ou a outros sítios e eu ficava. Isto não é para todos. Posso dizer-lhe que em todo o ano, só fazemos uma refeição como casal, é na Consoada e apenas por breves minutos. Nos outros 364 dias do ano, eu como a uma hora e o meu marido a outra. Abrimos todos os dias.”
Mas esta dedicação e esta disponibilidade fizeram do Café do Zequinha o mais frequentado. Chegou a fazer encomendas de tabaco no valor de 300 contos. Tornou-se uma das primeiras agências da região dos jogos da Santa Casa, tendo entregue vários prémios na ordem dos 20 mil contos. Ali se vendiam centenas de jornais diariamente. Durante muito tempo era o único local que tinha bolos, amêndoas da Páscoa e chocolates do Natal.
E depois há o café para beber, o melhor café de Belmonte, como garantem alguns dos clientes que não o dispensam, não o tomam noutro sítio. Pudemos comprovar essa ideia. É realmente bom. E com uma vantagem única, continua a custar a quantia redonda de 50 cêntimos!
Foi também para tomar um café que ali pararam grandes vultos da história portuguesa, incluindo primeiros-ministros e Presidentes da República, como Ramalho Eanes, Mário Soares, Jorge Sampaio, António Guterres… “Não me recordo se o Cavaco Silva cá veio, mas lembro-me bem daquele brasileiro, o Kubitschek”, afirma a Dona Alice, entre sorrisos.
O Café do Zequinha está para durar e o casal gostaria de ver o filho mais velho a tomar conta do espaço no futuro.
Jornal do Fundão (Romão Vieira, Lúcia Reis e Filipe Sanches)

2 comentários:

  1. O café do Zequinha é emblemático. Faz parte do meu imaginário infantil. Espero que os filhos da D. Alice assegurem a sua continuidade ou que alguém o faça por eles, mantendo-lhe a traça.

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  2. E quando era posto público de telefone, com o contador de impulsos? Não havia telemóveis e poucas casas tinham telefone… Ali era a «cabina», na cozinha do café!

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