Em dia de chuva, há quem visite o castelo de BelmonteDa porta da sua mercearia, Fausto Marques espreita o mundo. Vê passar gente de Espanha, França, Brasil e até Israel. O comerciante está no centro histórico de Belmonte desde 1975, altura em que abriu o seu estabelecimento. São muitos os turistas que passam à sua porta, mas poucos aqueles que entram. Ainda assim, «são os turistas que dão um pouco de vida a isto», desabafa.
A zona histórica de Belmonte tem cada vez menos habitantes, restam agora os turistas. São eles que vão preenchendo as ruas estreitas, na parte mais antiga da vila, terra natal de Pedro Álvares Cabral. De acordo com dados da Empresa Municipal para a Promoção e Desenvolvimento Social de Belmonte, em 2010 houve um aumento de 12 por cento no turismo face ao ano anterior, sendo que o Brasil, França e Espanha são os países de origem de quem mais visita a vila, também terra de cripto-judeus. Na mercearia de Fasto Marques entram sobretudo brasileiros. «A gente do Brasil é a mais simpática. Entram, querem conversar e comparam os preços da fruta», diz. Quem vem do país vizinho tem o mesmo hábito: «A primeira coisa que fazem os espanhóis é ver se os citrinos são de Espanha, se forem já não compram, porque querem é provar os do Algarve», revela o comerciante. Na sua loja, o turista compra pouco. «Uma água, uma peça de fruta, alguns vinhos da região», enumera. O comerciante acredita que o número de turistas se manteve ao longo do tempo, «quando abriu o “novo mundo” [Museu dos Descobrimentos] é que veio mais gente».
A maioria dos que cruzam a sua porta vem «por conta própria». De acordo com Fausto Marques, as excursões têm uma rota definida e raramente têm tempo para o comércio local. Descemos a rua e no Largo do Pelourinho, encontramos comerciantes que corroboram esta visão. «Aqui o turista é de passagem, os que trazem guias, raramente param», sustenta Ascensão Azevedo, que toma conta da loja da nora aos fins-de-semana. Anabela Azevedo, a proprietária, garante que vive dos turistas isolados. «Os meus principais concorrentes são os museus, porque vendem alguns artigos mais baratos», critica. No café ao lado, aberto recentemente, Hélio Nave traça o mesmo cenário: muita gente de passagem. «Os meus clientes são cerca de 20 por cento turistas e 80 por cento pessoas da terra», refere. Nos feriados e nalguns fins-de-semana, a percentagem inverte-se.
Quando começou o negócio, pensou que o número de excursões o ajudaria a encher a casa. No entanto, os maiores grupos costumam ir directos aos museus e acabam por não parar, o que significa que os seus clientes são essencialmente turistas isolados, que «procuram refeições ligeiras». «Os estrangeiros que mais vejo são de origem judaica, têm bastante poder de compra e, claro, algumas restrições nas refeições que pedem», acrescenta. De acordo com este comerciante, no café entram «turistas muito diferentes», alguns conversam, fazem perguntas sobre a região. Quase todos estão de passagem.
Em Belmonte, há quem não consiga sobreviver apenas do turismo, muitos não têm sequer esse intuito. Mas também há quem tenha decidido criar novos espaços a pensar naqueles que visitam a vila diariamente. É o caso de Ana Vicente, uma das proprietárias de um restaurante, junto ao castelo, inaugurado em 2008. «Os turistas são o nosso público-alvo e até agora não temos tido razões de queixa», adianta. Tendo em conta o espaço, são os pequenos grupos que mais lhe enchem a casa para conhecerem a gastronomia típica da região. É deste vaivém de gente que a cooperativa de artesanato, na Rua 1º de Maio, também vive. A aposta na originalidade é, neste caso, um caminho para cativar turistas. «Têm uma visão do que é bom, quando uma coisa é feita à mão, não há outra igual», garante Isabel Nave, uma das funcionárias. Trabalham com artesãos da zona e os vários artigos em burel (o tecido típico da Serra da Estrela) são muito comercializados, nomeadamente nos museus, onde a cooperativa também tem produtos à venda. No correr dos dias, Isabel Nave conhece várias nacionalidades. Muitos turistas que passam na loja querem saber mais sobre a comunidade judaica e mostram interesse em visitar a sinagoga. «Muitos ficam desiludidos quando vêem judeus, porque os imaginavam de outra forma», confidencia. Com o fecho de algumas fábricas de confecções no concelho, Isabel Nave acredita que é o turismo que agora dá vitalidade à terra. «Eu pergunto-me o que seria de Belmonte se não fosse o turismo?», questiona.
António e Antónia Beja vieram de Sines para conhecer a Beira Baixa. Hospedados na Covilhã, queriam participar no Festival da Castanha, que decorreu no último fim-de-semana. Almoçaram na vila e «gostaram dos pratos típicos». Não sabiam da existência dos quatro museus e, por isso, passearam apenas pelo castelo. «Estamos a gostar muito da vila, mas o que notámos é que é um pouco deserta, não se vê ninguém, talvez seja do tempo», lamenta Antónia. Junto ao castelo, encontramos também Vítor Bilro, que veio de Vila Viçosa, numa excursão pelas Aldeias Históricas da região. De Belmonte, guarda a vista sobre a Cova da Beira. Ainda não sabia o que iria visitar porque «isso é com o “chauffeur”», declarou. O seu grupo traz duas guias, que são quem decide as rotas. Já Evaristo Moreira, de Vila Nova de Gaia, quis mostrar Belmonte à família porque já tinha estado na região. As filhas gostaram do castelo, pois «é aventureiro». Nenhum destes turistas ficou hospedado em Belmonte, estavam apenas de passagem.
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